Como se 1975 fosse ontem, a lembrança do
“passamento” de uma tia-bisavó, acontecia numa tarde de chuva com sol como em
dia de casamento de espanhol o que tornava o momento único e eu, com 7 anos, chorava
uma saudade que, a partir dali, seria minha companheira...
O caminho, chamado passamento, era feito a pé
e as pessoas que seguiam em solidariedade caminhavam cantando hinos alternando
com orações em tom de drama... Fiquei com medo, confesso.
Enfim, depois de uma extenuante caminhada,
pois minha parenta morava perto do Antigo Cine-Luz, me deparei com grandes
muros que separavam os vivos dos mortos... Contudo, mesmo sabendo que ali era
uma cidade de mortos, a curiosidade infantil me fez passear entre túmulos bem
cuidados que pareciam gigantes devido a minha pequena altura com suas estátuas
de anjos que me fazia tremer...
O cemitério parecia realmente uma cidade sem
vida... Mas de forma estranha bela com seus jardins, flores, estátuas, fotos em
preto e branco, epitáfios que já chamavam a minha atenção, pois, contavam a
história de pessoas que residiam naquele Jardim de Pesar... A partir dali, a
palavra saudade passou a ter um endereço chamado Cemitério São Marcos...
Passei a infância visitando o Cemitério no
mínimo 2 vezes ao ano com meus avós. Não, não o Cemitério... Visitávamos a
minha tia-bisavó entre outros parentes e amigos que se juntaram a ela... Tudo
bem, realmente eu achava estranho visitar o cemitério para “encontrar” alguém
que estava no céu, todavia, como dizia minha mãe, ali estavam apenas restos
mortais e histórias de vidas, logo, para não esquecer que todos possuímos uma
origem, uma descendência, assim, nossos mortos persistem a nos lembrar de onde
viemos e para onde vamos um dia...
Minha família, como muitas que lá eu
encontrava, comemorava a vida e lamentava a morte... Todos contavam de suas
saudades e como era viver a partir do fim de alguém querido... Levavam flores,
limpavam cuidadosamente o entorno de cada túmulo o que tornava o ambiente, mais
que nunca, a cidade que eu via, com ruas, calçadas, jardins e estátuas a vigiar
mais os vivos do que os mortos...
Uma observação, aquela cidade de túmulos era
bem cuidada, já que, dentro daqueles muros havia a história de nossa gente de Monte
Alegre, Cidade Nova e Telêmaco Borba...
Mas o
tempo como o vento se passa...
Lá no São Marcos, junto com minha tia-bisavó há,
agora, uma multidão de gente que viveu conosco hoje, esquecidos estão entregues
a ação do tempo, do vento e do esquecimento...
O
que acontece conosco em Telêmaco Borba?
Será que um cemitério é assunto pequeno
diante da balburdia da saúde pública, do trânsito caótico, da falta de creches,
dos buracos do asfalto, das filas do SUS, da violência pública... Um cemitério
pode ser esquecido, pois, o orçamento público nunca se vota, o candidato da
terra nunca vira nada, o pára-quedista chega “chegando”, o fulano que se canditará
nas próximas eleições municipais precisa ser vigiado, o cargo prometido e não
foi cumprido, as denúncias nas Redes Socias... O carro do secretário, as diárias
dos poderosos, as contas do ex-prefeito, a CPI da Rodoviária, a festa de 50
anos... Enfim, a poluição sonora pública é muito maior que o silêncio funesto
da Eterna Morada...
Confúcio pensador Chinês há mais de
1500 anos já dizia: “Para que preocuparmo-nos com a
morte? A vida tem tantos problemas que temos de resolver primeiro...”
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